Da Redação – Estradas clandestinas que levam a grandes áreas com rastros de desmatamento e utilizadas como pastagem para gado. Este foi o cenário que a reportagem da Rede Amazônica encontrou durante visita à Terra Indígena Uru-Eu-Wau-Wau, localizada em Rondônia.
Segundo lideranças, ativistas e povos indígenas, os crimes ambientais não são recentes, mas estão aumentando nos últimos anos.
“Dentro da Terra Indígena, a criação de gado vem acontecendo há muito tempo, só que nos últimos anos ela se intensificou. Recentemente, entre 2020 e 2021, as invasões aumentaram muito”, apontou Bitaté Uru-Eu-Wau-Wau
“No começo de 2020 nós [estávamos] indo trabalhar, pescar e essas coisas, dentro do nosso próprio território, e encontramos um desmatamento de mais de 200 hectares dentro da Terra Indígena”, relembra Bitaté.
Segundo a ativista e fundadora da Associação de Defesa Etnoambiental Kadindé, Ivaneide Bandeira, é necessária uma mudança urgente para frear os desmatamentos e invasões na TI Uru-Eu-Wau-Wau.
“A TI está invadida em seus limites e em seu interior. É impressionante você ver a quantidade de gado dentro da terra. Precisamos urgentemente que a fiscalização vá lá e tire esses invasores, tire esses madeireiros, prenda e responsabilize pelos danos ambientais que estão causando ao território indígena”, disse.
Dados do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon) apontam que, entre as TIs da Amazônia Legal, a Uru-Eu-Wau-Wau foi a que teve o entorno mais desmatado em 2021. Entre agosto de 2020 a julho de 2021, a TI também foi a maior vítima de ameaça e pressão de desmatamento. Nos dados dos meses seguintes, a área não foi mais a primeira, mas sempre esteve entre as 10 mais afetadas.
Através de um time-lapse do Google Earth, é possível ver como a mudança das florestas afetou o território em volta da TI Uru-Eu-Wau-Wau entre 1984 e 2020.
Influência do Poder Público
De acordo com o Ministério Público Federal (MPF), as invasões nas terras indígenas de Rondônia são constantes e incentivadas pelo Poder Público.
“Ultimamente o Poder Público tem incentivado, divulgando que vai regularizar garimpo em área indígena, vai regularizar garimpo em Unidades de Conservação. A gente tem investigado mas, infelizmente, o Poder Público não vem fornecendo as verbas adequadas para fiscalização e discursando a favor dessas ilegalidades em áreas que são protegidas, está dificultando o trabalho do MPF”, aponta o Procurador da República em Rondônia, Raphael Bevilaqua.
Discursos de oposição à fiscalização
No último mês, um vídeo do deputado Geraldo da Rondônia com posicionamento contra órgãos de fiscalização ambiental, gerou repercussão no meio político do estado. Durante discurso o deputado falou para a população que vai “ajudar a botar fogo” nos veículos de agentes (veja abaixo).
“Vamos combinar uma coisa? Quando vier [fiscalização] usa meu nome. Me liga, que eu vou ajudar vocês a botar fogo na caminhonete deles. Vamos botar fogo nos caminhões deles, nos carros deles [dos agentes de fiscalização ambiental]. E vamos combinar mais uma coisa? Vamos fazer um manifesto pra não deixar eles entrarem aqui nessa região”, disse Geraldo de Rondônia.
O discurso aconteceu durante uma audiência pública realizada pela Assembleia Legislativa de Rondônia (ALE-RO) no distrito de Jacinópolis em Nova Mamoré (RO), a cerca de 300km de Porto Velho. Segundo a Comissão Pastoral da Terra (CPT), essa é uma região violenta com registro de conflitos no campo.
Na época, o deputado explicou, em nota, que não estava incitando a violência contra órgãos fiscalizadores, que o discurso foi direcionado “a trabalhadores e pais de família que lutam pela regulamentação da área de trabalho”.
Tragédia no povo Uru-Eu-Wau-Wau
A violência em terras indígenas causou perdas, como a morte de Ari Uru-Eu-Wau-Wau, que ocorreu há pouco mais de dois anos. Ele foi morto durante a noite de 17 de abril de 2020 e o corpo foi encontrado na manhã seguinte, com sinais de lesão contundente na região do pescoço, que ocasionou uma hemorragia aguda. Nenhum suspeito do crime foi preso.
Ari trabalhava registrando e denunciando extrações ilegais de madeira dentro da aldeia, pois fazia parte do grupo de monitoramento do povo indígena Uru-Eu-Wau-Wau. Para a comunidade indígena é uma perda inestimável.
TI Uru-Eu-Wau-Wau
A Terra Indígena Uru-Eu-Wau-Wau possui mais de 1,8 mil hectares e se espalha por 12 municípios rondonienses. A maior parte do território fica em Guajará-Mirim (RO) e São Miguel do Guaporé (RO).
Povos de nove etnias vivem na TI, entre eles, diversos indígenas isolados. São eles:
- Amondawa
- Isolados Bananeira
- Isolados do Cautário
- Isolados no Igarapé Oriente
- Isolados no Igarapé Tiradentes
- Juma
- Kawahiva Isolado do Rio Muqui
- Oro Win
- Uru-Eu-Wau-Wau
Fonte – G1/RO